terça-feira, 18 de junho de 2013

A teoria que desencanta

Certa vez, fiz uma avaliação com meus alunos… Pouca coisa: Uma produção de texto que destacasse a importância do estudo da Literatura para alunos de ensino médio. Deveriam, para isso, valer-se de argumentos retirados dos conteúdos de Literatura, gramática e produção de texto trabalhados em sala… Teriam duas aulas para fazer a prova e poderiam consultar tudo o que estivesse ao seu alcance, inclusive o colega…

Foram devidamente avaliados por mim e as respectivas notas (nenhuma menor que sete) registradas no diário que ainda insiste em nos convencer que devemos resumir o conhecimento de nosso aluno num número. Na folha de avaliação, somente um “visto” e minha rubrica. Nada de números… Os professores de matemática me perdoem, mas colocar um número de um a dez em vermelho no trabalho do aluno não reflete a qualidade de sua produção, além de ser um fator excludente, pois aqueles que tiram melhores notas têm subsídios suficientes para humilhar aqueles com notas menores que a sua… Meus colegas das exatas: prefiro que os números fiquem somente nos cálculos que já são difíceis de ensinar de forma prazerosa por vocês em sala de aula…

Muitos me perguntaram: “Cadê minha nota, professor?”… “Está no diário”… Respondi imediatamente… “Então diga nossas notas”… Quando o professor atende um pedido desses, comete um erro gravíssimo que acontece em todas as escolas por onde passei… A divulgação de notas em público, não deixa de ser uma forma de bullying contra aqueles que não alcançaram aquilo que exige o sistema… Outra coisa humilhante é divulgação de resultados finais no mural. Todos verão quem passou e quem reprovou… Poderão parabenizar os aprovados, mas também terão a chance de humilhar os reprovados… Que tal a gente discar 100 e denunciar isso também?…
Perguntei a um aluno, qual a razão de querer saber a nota da prova. Ele me respondeu que queria saber onde poderia melhorar. Pedi que sentasse ao meu lado com seu texto e fizemos, juntos, a correção. Naquele instante, nem eu nem ele lembramos da nota. Ele se tornou um dos melhores alunos escritores daquele ano…

Quantas vezes cortamos as asas do nosso aluno só pelo fato de o tratarmos como número. Não o deixamos voar. Queremos que ele espere a sua nota e, quando atingir o tão sonhado 10, não precisa mais se esforçar. Afinal, chegou ao topo, já tem a nota máxima, não há necessidade de melhorar, já está moldado na forma da educação tradicional…

Até que ponto uma nota dez no boletim ajuda na vida cotidiana do estudante? Conheci uma pessoa que foi aprovada no segundo ano de ensino médio com quarenta pontos em Língua Portuguesa… No terceiro ano, sua professora lhe pediu que produzisse uma dissertação argumentativa e ela não havia conseguido desenvolver, sequer um parágrafo, mesmo tendo visto todo o conteúdo necessário para realizar aquela tarefa no ano anterior… Suas notas estavam no topo, mas seu conhecimento não passava de teoria… Nós, professores, insistimos em ensinar um monte de regras inúteis que só servirão para o aluno odiar ainda mais as linguagens. E o pior é que, muitas vezes nós mesmos as julgamos sem serventia, mas ensinamos para não fugir ao planejamento… Aliás, planejamento feito por nós mesmos, muitas vezes repetido ao passar dos anos, tendo somente a capa e folha de rosto modificadas…

Para inflamar ainda mais as críticas ao meu trabalho, resolvi aplicar a mesma prova no exame final. Desta vez, é claro que o aluno não teve direito a nenhuma consulta… “Assim todos vão ser aprovados na tua matéria”… Me criticava alguém…. Mas nem todos alcançaram a vitória, pois a meu ver, um aluno de ensino médio deve ler, analisar e produzir bons textos. Não me importa se ele não souber fazer perfeitamente uma análise sintática (A maioria de nós, graduados em Letras, também não sabemos), o que realmente vai torná-lo um cidadão melhor e atuante na sociedade é aquilo que ele interpreta dela, por consequência forma uma opinião e busca soluções… Isso deveria ser o grande objetivo dos professores de todas as disciplinas. Ocorrendo isso, certamente nosso aluno se tornaria um adulto maduro e impossível de ser manipulado pelas autoridades que já começam abusando de nossa inteligência e cidadania com a compra de votos nas eleições democráticas e corruptas que temos a cada quatro anos…

Portanto, vamos nos unir, professores, alunos e comunidade, a fim de trabalharmos aquilo que realmente vai fazer nosso aluno crescer enquanto cidadão… Façamos o nosso trabalho, sem criticar outras escolas e professores anteriores do nosso estudante… O aluno é um ser humano e deve ser tratado como tal… Mas ele deve saber que os professores também são humanos e passíveis de erros, enganos e atitudes errôneas… Escola é lugar de gente… E gente está sempre aprendendo e ensinando, independente de situação, ou títulos que carrega…

Texto: Márcio Roberto Goes
Fonte: http://www.marciogoes.com.br/

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